Sorraia
Os Cavalos do Sorraia são os últimos descendentes do cavalo selvagem do sul da Península Ibérica que, aparentemente, sobreviveram no então inacessível vale do rio Sorraia em Portugal. O hipólogo português Dr. Ruy d'Andrade descobriu em 1920, enquanto caçava, a última manada existente desta raça, tornando-se o responsável pela sua preservação. Chamou-os de "Sorraia", por causa do Rio Sorraia, local onde os descobriu. Admite-se que no passado em Portugal, estes cavalos selvagens tenham sido conhecidos por "zebro" ou mesmo "zebra".
Os Cavalos do Sorraia medem aproximadamente entre 1,40 m e 1,48 m na cernelha e são sempre de coloração baia ou rato. Quando domados, podem-se tornar nuns obedientes animais de sela. Actualmente existem aproximadamente 200 cabeças, encontrando-se a maior parte em Portugal, embora a Alemanha também detenha um bom número. Nos dias de hoje, esta espécie já não vive em regime selvagem, mas é criada de maneira natural pela família d'Andrade. Contudo, os que pertencem à Coudelaria Nacional são normalmente mantidos em estábulos e tratados como se fossem apenas mais uma criação de cavalos.
Ainda hoje existe uma manada selvagem, que sobrevive sem qualquer ajuda humana no "Refúgio do Vale de Zebro Sorraia" a nordeste de Lisboa.
É frequente os Sorraias, serem erradamente apresentados como uma raça domesticada. O seu salvador, Dr. Ruy d'Andrade, zoologista, paleontólogo, um dos mais conceituados criadores de cavalos Lusitanos e um especialista de renome em Cavalos Ibéricos, considera-os como uma subespécie selvagem e um antepassado do cavalo Lusitano, teoria entretanto comprovada através de pesquisas moleculares e genéticas. Ao criar Sorraias como uma raça domesticada, não se contribui para a sua preservação, mas antes para a sua mudança contrariando os ideais do Dr. Ruy d'Andrade – se ele não tivesse acreditado que Sorraia fosse uma subespécie selvagem, não teria dado uma palestra sobre Sorraias no XII Congresso Internacional de Zoologia em Lisboa.
SORRAIA – UMA RAÇA DOMESTICADA?
A forma como os Sorraias são alimentados e criados actualmente, pode levar a que rapidamente esta raça se transforme em mais uma raça domesticada. Chamar a estes cavalos uma criação, é exactamente o oposto do que Ruy d'Andrade pensaria e do que tentou preservar. Se os cavalos que ele chamou de "Sorraias" tivessem existido como uma criação, ele teria tido conhecimento disso e não iria arriscar a sua reputação como cientista, descrevendo-os como descendentes selvagens dos cavalos da Idade do Gelo.
Do seu relatório e notas, há especialmente dois parágrafos, que frequentemente são mal interpretados. Um é o relato da sua descoberta destes cavalos:
"Mais tarde, em 1920, andando à caça na região de Coruche, no baixo Sorraia, numa propriedade chamada 'Sesmaria', deparei com uma manada de uns 30 indivíduos, mais de metade dos quais eram baios claros, alguns ratos, muito zebrados e com aspecto geral absolutamente selvagem ou primitivo, como se fossem uma espécie de zebras ou hemiones."
É essencial referir, que Ruy d'Andrade, não faz qualquer referência ao facto desta manada, consistir em cavalos de diferentes cores, apesar de frequente e erradamente interpretado dessa maneira. O que ele referiu, é que mais de metade desses cavalos eram baios claros – ele não diz se os outros, nem refere especificamente se haveria outros, seriam de cor baia mais escura. Relativamente aos de cor rato "muito zebrados", ele não refere quantos haveria de cor rato e menos zebrados. De facto, ele não menciona quaisquer outras cores, além de baio ou rato. Isto deixa a possibilidade, de alguns dos cavalos daquela manada, não serem de cor nem baio nem rato, mas o facto é que ele não mencionou qualquer outra cor – e, além disso, a existência de outras cores nunca constituiria um problema, já que de uma população remanescente, não se pode esperar que de alguma forma continue pura.
Baseados em análises de genética molecular, sabemos hoje, que o Sorraia não é apenas o produto de criações seleccionadas com cores baio/rato em cavalos domesticados, nomeadamente Lusitanos e Andaluzes. Isto foi provado através de análises mitochondrial de ADN por uma equipa liderada pelos geneticistas Prof. Dr. Klaus Olek e Dr. Thomas Jansen, e também pelo hipólogo Hardy Oelke.
O Cavalo do Sorraia não tem história como raça domesticada, o que condiz com as pinturas rupestres do antepassado cavalo Ibérico selvagem e descrições históricas; por essa razão, deve ser considerado uma subespécie original. Tudo o que é possível referir acerca do cavalo Przewalski como uma subespécie selvagem, é válida também para o Sorraia, com a excepção, de que a subespécie Sorraia, tal como o Tarpan, nunca foi cientifica e zoologicamente descrita e reconhecida.
Noutra parte dos apontamentos de Ruy d'Andrade, este relata o que tentou fazer para preservar o Cavalo do Sorraia:
"Quis então tentar reconstituir este tipo primitivo de cavalo no propósito de averiguar se realmente seria esta a origem dos nossos cavalos andaluzes, actualmente com maior estatura e variaçã0 de forma pelos cruzamentos que têm suportado, e dispus-me a reproduzir o que a criação em regime exclusivamente manadio, de autêntica vida selvagem, tinha produzido nas Américas, fazendo surgir o actual cavalo cimarron – o crioulo."
Aqui, "reconstituir" pode facilmente ser mal interpretado, devido aos assim chamados "Tarpans reconstituídos", que estão em exposição em vários jardins zoológicos e registados como uma criação na América do Norte. O "Tarpan reconstituído" foi criado num processo de criação/procriação usando diferentes criações de póneis, Koniks Polacos e também, cavalos Przewalski. Noutras palavras, foi um cruzamento planeado. O que Ruy d'Andrade fez, foi totalmente diferente. Ele tentou salvar o que ainda existia e restabeleceu uma população viável, não expondo os cavalos a uma situação de "sobrevivência do mais forte", mas deixando-os viver no seu habitat natural.
O Cavalo do Sorraia – uma subespécie em perigo de extinção e uma preciosidade, que até agora, teima em não desaparecer. No Refúgio do Vale de Zebro Sorraia estes cavalos tem a possibilidade de se restabelecer. É um projecto em memória de Ruy d'Andrade e à personalidade deste grande estudioso português.
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